Não é novidade que aspectos associados à nostalgia refletem também no meio musical. Analisando as últimas músicas virais, percebemos que o público vive um intenso resgate de elementos característicos que marcaram gerações passadas. Isso consequentemente, modifica as distintas formas de produzir música.
As plataformas de streaming, por exemplo, possibilitam o acesso a uma vasta quantidade de músicas para que os usuários possam ouvir álbuns e faixas de diversos gêneros e subgêneros. Por isso, é mais que comum a frequência destes resgates musicais, estamos diante de uma grande biblioteca a ser explorada todos os dias. Aliás, estamos acostumados inclusive em ouvir determinada canção e ao identificar um instrumento típico de determinado(a) período, gênero ou localidade, fazer a associação.
Primeiras experimentações
O synth-pop, subgênero do new wave, teve seu auge na década de 80, tendo suas origens no final da década de 70 no Japão e na Inglaterra. O gênero foi enaltecido pelo movimento britânico New Romantics, que nada mais era do que um estilo underground, glam, com influências do período romântico do final do século 18 e início do 19. Musicalmente, é marcado pela utilização de sintetizadores e pode ser considerado como um precursor da música eletrônica. No contexto da época, havia um apreço por temáticas associadas à tecnologia, modernidade e futuro, o que reverberou diretamente na musicalidade.
Entre os artistas que adentraram nessa nova perspetiva musical, se destacam primeiramente os alemães da banda Kraftwerk até a popularização do subgênero com Enjoy The Silence e New Life do Despeche Mode, Don’t You Want Me do The Human League e a viral Sweet Dreams do Eurythmics. Bandas como Tears for Fears, com o hit Everybody Wants to Rule The World, Duran Duran e as clássicas Save a Prayer e Hungry Like the Wolf’ junto com a atemporal Take on Me do A-ha, se enquadram na perspectiva do new wave. Elas, ainda destacam outros instrumentos como guitarra elétrica, assim como Heart of Glass da Blondie, que ganhou uma versão honrosa da cantora Miley Cyrus recentemente.
Little Dark Age
Pegando um recorte do ano de 2018 até 2022, podemos destacar grandes sucessos que propõem a estética do new wave e synth-pop com outros gêneros. É o caso da banda de pop rock estadunidense MGMT com o álbum Little Dark Age de 2018. A obra segue sendo um dos melhores álbuns do gênero lançados atualmente. Destaco a faixa título que se tornou viral no Tik Tok e Instagram e faço uma menção as faixas James, Me and Michael e One Thing Left To Try.
After Hours
No ano de 2019 tivemos o sucesso estrondoso de ‘‘After Hours’’, quarto álbum de estúdio do cantor estadunidense The Weeknd. A produção que mescla do R&B ao eletrônico do new wave se finca como um dos maiores sucessos dos últimos anos. O carro chefe Blinding Lights continua quebrando recordes contendo mais de 3 bilhões de streamings só no Spotify.
O disco em si é uma experiência familiar para quem já acompanha os trabalhos anteriores do artista. A maior distinção se dá pela mescla aos sintetizadores característicos do synth-pop aos beats clássicos do R&B. As faixas Too Late, Heartless, Hardest To Love, In Your Eyes e é claro Blinding Lights destacam os aspectos mais peculiares que tornam este disco o sucesso que ele é. Super válido mencionar também a versão remixada de Save Your Tears que é (para mim) uma das melhores baladas pop da atualidade, a dupla Ariana Grande e The Weeknd é certeira. Ela me lembra também o sucesso Words do artista franco-tunísio F. R. David.
Plastic Hearts e Future Nostalgia
No ano de 2020, o pop rock de Miley Cyrus em Plastic Hearts também foi influenciado pelo new wave e synth-pop. Acredito que pela familiaridade de Cyrus com o gênero e após o sucesso de sua regravação, já mencionado aqui do clássico Heart Of Glass, a artista trouxe um álbum que nos leva a um campo onde a artista domina. Dele destaco as músicas Midnight Sky, Gimme What I Want, Night Crawling ao lado do ícone dos anos 80, Billy Idol, e de presente Edge Of Midnight que apenas pelo título não precisa mencionar que conta com a participação da brilhante Stevie Nicks.
Outra artista em ascensão nos agraciou com Physical em um dos melhores álbuns de 2020. Dua Lipa trouxe uma sonoridade carregada de referências aos anos 80 e 70, com elementos que variam do disco, dance, new wave, pop e synth-pop. O álbum Future Nostalgia levou o prêmio de Melhor Álbum Pop na 63ª Edição do Grammy e emancipou a cantora como uma das maiores estrelas pop da atualidade.
Scaled and Icy
O renomado duo vencedor do Grammy, Twenty One Pilots, trouxe em 2021 seu sexto álbum de estúdio Scaled and Icy, uma nova proposta que mescla rock alternativo e rap com indie pop, synth-pop e new wave. Apesar de não ter sido seu maior sucesso, o disco traz canções com bastante influência dos gêneros que atingiram seu auge na década de 80. Destaco as faixas The Outside, Shy Away como uma das melhores.
Harry’s House, Dawn FM, Car Crash (e estamos aguardando)
Chegando em 2022, faço uma menção honrosa novamente a do The Weeknd com o álbum Dawn FM, dando continuidade aos seus projetos em R&B e synth-pop, e também à Crash de Charli XCX que surpreendeu positivamente.
O ponto alto do ano, sem dúvidas, foi o sucesso do primeiro single do Harry’s House, terceiro álbum de Harry Styles. As It Was se tornou um fenômeno nas redes sociais logo após seu lançamento e se tornou a música solo mais rápida ao atingir 1 bilhão de streams no Spotify. Desde sua estreia na carreira solo, Styles coleciona hits e já é um dos maiores artistas desta geração. Além de carro chefe do álbum, destaco as canções Late Night Talking, Keep Driving, Satellite e Love of My Life, que são uma mistura de pop, folk e synth-pop.
De fato, é interessante acompanhar a forma que a indústria musical se molda no decorrer das décadas. As experimentações são cada vez mais constantes, o que consequentemente possibilita estarmos diante de criações de novos gêneros e subgêneros.